Teoria dos dois mundos
Platão
tentou solucionar o problema dos pré-socráticos, em especial o deixado pela
disputa entre Heráclito (que acreditava no movimento com o real) e Parmênides
(que, desenvolvendo o "teoria do ser" dentro de um argumento lógico e
ontológico) negava o movimento. Com a teoria dos dois mundos de Platão, o mundo
inteligível e o mundo sensível, o problema estava aparentemente solucionado.
Aristóteles
de Estagira (384-322) aprendeu bem tal teoria na Academia, tendo se tornado o
principal discípulo de Platão. Quando fundou sua própria escola, o Liceu, ele
desenvolveu o ensino da filosofia de Platão e iniciou uma revisão crítica
desta. Pois Aristóteles, paulatinamente, voltou ao problema da disputa entre
Heráclito e Parmênides, acreditando então que a solução de Platão não havia
sido suficiente.
A
idéia de que era ilusão que as coisas eram estáveis, como Heráclito defendeu,
ou que a mutabilidade era uma ilusão, como Parmênides defendeu, pareceu a
Aristóteles não poder ser solucionada pela linguagem platônica de que o mundo
mutável (apreendido pelos sentidos) é uma imitação, uma cópia do mundo imutável
(apreendido pela razão). Platão falou em mundo das formas e mundo material,
sensível, como mundos distintos. Aristóteles manteve essa linguagem, mas
localizou a forma e a matéria não em dois mundos de fato, mas como duas
características da mesma realidade, e que eram distintas apenas no pensamento
humano.
Para Aristóteles, não cabia a idéia de que
as formas eram causas das coisas materiais se, como Platão, admitíramos que a
causa ficava em um mundo e a matéria, a coisa, noutro. As formas estariam no
mundo tanto quanto as coisas. As formas estariam incorporadas nas coisas, no
mesmo mundo, no mundo real, existente, visível. Aristóteles continuou dizendo,
como Platão, que a forma era essencial, mas como natureza da coisa, se
relacionando com as coisas não pela idéia de cópia e realidade, mas pela idéia
de função.
A
matéria das coisas é a substância, como Aristóteles afirmou, e cada substância
teria uma essência que seria mais ou menos sua forma, todavia, diferentemente
de Platão, essência e substância não se separariam. Se fossem para ser
separadas, e poderiam ser, segundo Aristóteles, é porque, no pensamento (e
somente no pensamento), trabalhamos em um sentido de fazer abstrações,
análises.
Aristóteles,
ao fazer essa virada na filosofia de Platão, redefiniu o papel do filósofo.
Este passou a ser aquele que trabalharia com classificações, identificando nas
coisas a essência, ou seja, as formas, e os acidentes, mas toda essa observação
seria dirigida ao mundo sensível; o mundo, que é um só.
O que
Aristóteles disse foi que Platão não solucionou o problema da mutabilidade
versus imutabilidade. Um objeto particular, disse Aristóteles, tem forma e
matéria. Isso é uma substância, escreveu ele. Agora, cada substância conteria
uma essência, grosseiramente, seria a forma. O filósofo seria aquele que pode,
por pensamento, ir fazendo essa distinção e ir catalogando as coisas do mundo,
dizendo o que nelas é essencial e o que nelas é acidental. O velho e clássico
exemplo, que inclusive serviu durante muito tempo como doutrina, é o do homem:
o ser humano, disse Aristóteles, deve ser racional, de modo que isto é parte da
essência humana, enquanto que ter ou não cabelo é contingencial.
Assim,
contra o dualismo (ontológico) platônico, que ficou não só como uma
característica da metafísica platônica, mas quase que como uma característica
de toda metafísica ocidental, Aristóteles trouxe o pluralismo.
O
problema do movimento, em Aristóteles, foi equacionado de outro modo, em termos
do que ele chamou de potencialidade e realidade. Cada coisa é em potencial
outra, como a semente é em potencial uma árvore. Cada coisa muda na sua parte
contingente, mas não na sua essência, de modo que cada coisa possui uma
teleologia interna, que a faz entrar em movimento passando do que é potência
para o que é ato real.
A
interpretação aristotélica do movimento foi, também, uma teoria causal a
respeito do que ele chamou de substância. Assim, ele categorizou os tipos de
causas; formais, materiais, eficientes e finais. Substância, para Aristóteles,
tem forma e matéria, sendo que a forma é a essência, e esta, por sua vez, tem a
ver com a causa formal. Por exemplo, se pensamos em contruir uma boneco a
partir de uma pedaço de madeira, temos a forma em nossa mente, e tal forma na
nossa mente será a causa formal que criará, quando atuarmos com nosso canivete
na madeira, o boneco.
Agora,
a causa material tem a ver com o elemento externo, a própria madeira; sem ela
como causa não faríamos o boneco. Todavia, se não botarmos uma certa energia em
nosso canivete, nada acontecerá. Quando botamos nosso canivete para funcionar
estamos mudando a madeira, transformando-a em boneco, e isso é a causa
eficiente ¾ eficientemente causamos o boneco. Se o boneco ficar bom, que era de
fato nosso propósito, que ele não desagrade nossos olhos, espelhando proporções
agradáveis, isto só ocorreu por conta de um objetivo que tínhamos, uma
finalidade, ou, em outras palavras, há aí uma causa final. Com os quatro tipos
de causas, eis que então, causa-se o efeito: o boneco.
Como em
Platão, há uma teleologia nessa teoria aristotélica: tudo se movimenta buscando
a perfeição. Todavia, se Platão tem as formas perfeitas para serem copiadas
pelos elementos mundanos, Aristóteles tem em, cada objeto, um impulso que
percorre quatro causas, sendo que a última busca a perfeição.
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirNo contexto discutido por você, o mundo das ideias para Platão era o mundo do início, do Bem, da Verdade, o mundo do Humano. — até que um ser supremo, Demiurgo, decidiu criar coisas a partir das mesmas, como as pessoas, as sociedades, os costumes, e assim por diante, ou seja, coisas imperfeitas.
ResponderExcluirPara ele, qualquer compreensão adequada sobre as coisas do mundo sensível deveria abstrair as suas imperfeições e chegar até a sua essência, chegar até o seu ideal.
Por exemplo: no mundo existem diversos tipos de pessoas – grandes, pequenos, claros, escuros, etc — mas apesar todos têm em si a essência do que é um homem. O mesmo raciocínio vale para os valores humanos sobre os valores humanos.