sexta-feira, 25 de maio de 2012


Filosofia da Educação


       A filosofia da educação é um ramo do pensamento que se dedica à reflexão sobre os processos educativos, à análise do(s) sistema(s) educativo(s), sistematização de métodos didáticos, entre diversas outras temáticas relacionadas com a pedagogia. O seu escopo principal é a compreensão das relações entre o fenômeno educativo e o funcionamento da sociedade.
       São várias as teorias educacionais "tradicionais" e "progressistas".
       A filosofia educacional de Platão foi baseada em sua visão da República ideal, onde o indivíduo era melhor servido ao ser subordinado a uma sociedade justa. Ele defende remover as crianças dos cuidados de suas mães e cuidar delas através do Estado, com grande cuidado para diferenciar as crianças adequadas para as várias castas, a maior delas recebendo a melhor educação, para que elas possam agir como guardiões da cidade e cuidar dos menos aptos. A educação seria holística, incluindo fatos, habilidades, disciplinas físicas, e música e arte, que ele considerava a maior forma de esforço.
       Platão acreditava que o talento não era distribuído geneticamente e portanto deveria ser encontrado em crianças de qualquer classe social. Ele desenvolveu isso ao insistir que aqueles considerados aptos deveriam ser treinados pelo Estado para que fossem qualificados para assumir o papel de uma classe dominante. Isso estabelece, essencialmente, um sistema de educação pública seletiva baseada na premissa que uma minoria educada da população é, por virtude da sua educação, suficiente para uma governança sadia.
Os escritos de Platão contém algumas das seguintes ideias:
        A educação elementar deveria ser confinada para a classe guardiã até a idade de 18 anos, seguido de dois anos de treinamento militar compulsório e depois ensino superior para aqueles que estiverem qualificados. Enquanto que o ensino elementar moldava a alma para responder ao ambiente, o ensino superior ajudava a alma a procurar pela verdade que a ilumina. Tanto os meninos como as meninas recebiam o mesmo tipo de educação. Educação elementar consistia de música e ginástica visando treinar e misturar qualidades gentis e fortes nos indivíduos e criar uma pessoa harmoniosa.
       Ao chegar aos 20 anos, é feita uma seleção. Os melhores receberiam um curso avançado em matemática, geometria, astronomia e harmônica. O primeiro curso na área de ensino superior duraria dez anos. Esse curso seria para aqueles que estão mais aptos para a ciência. Aos 30 anos seria feita uma nova seleção; os qualificados estudariam dialética e metafísica, lógica e filosofia pelos próximos cinco anos. Eles estudariam a ideia do bem e os primeiros princípios dos seres. Depois de aceitar uma posição júnior nas forças armadas por quinze anos, a pessoa teria completado sua educação teórica e prática aos cinquenta anos.

Fonte: Wikipedia

Teoria dos dois mundos

        Platão tentou solucionar o problema dos pré-socráticos, em especial o deixado pela disputa entre Heráclito (que acreditava no movimento com o real) e Parmênides (que, desenvolvendo o "teoria do ser" dentro de um argumento lógico e ontológico) negava o movimento. Com a teoria dos dois mundos de Platão, o mundo inteligível e o mundo sensível, o problema estava aparentemente solucionado.
        Aristóteles de Estagira (384-322) aprendeu bem tal teoria na Academia, tendo se tornado o principal discípulo de Platão. Quando fundou sua própria escola, o Liceu, ele desenvolveu o ensino da filosofia de Platão e iniciou uma revisão crítica desta. Pois Aristóteles, paulatinamente, voltou ao problema da disputa entre Heráclito e Parmênides, acreditando então que a solução de Platão não havia sido suficiente.
        A idéia de que era ilusão que as coisas eram estáveis, como Heráclito defendeu, ou que a mutabilidade era uma ilusão, como Parmênides defendeu, pareceu a Aristóteles não poder ser solucionada pela linguagem platônica de que o mundo mutável (apreendido pelos sentidos) é uma imitação, uma cópia do mundo imutável (apreendido pela razão). Platão falou em mundo das formas e mundo material, sensível, como mundos distintos. Aristóteles manteve essa linguagem, mas localizou a forma e a matéria não em dois mundos de fato, mas como duas características da mesma realidade, e que eram distintas apenas no pensamento humano.
        Para Aristóteles, não cabia a idéia de que as formas eram causas das coisas materiais se, como Platão, admitíramos que a causa ficava em um mundo e a matéria, a coisa, noutro. As formas estariam no mundo tanto quanto as coisas. As formas estariam incorporadas nas coisas, no mesmo mundo, no mundo real, existente, visível. Aristóteles continuou dizendo, como Platão, que a forma era essencial, mas como natureza da coisa, se relacionando com as coisas não pela idéia de cópia e realidade, mas pela idéia de função.
        A matéria das coisas é a substância, como Aristóteles afirmou, e cada substância teria uma essência que seria mais ou menos sua forma, todavia, diferentemente de Platão, essência e substância não se separariam. Se fossem para ser separadas, e poderiam ser, segundo Aristóteles, é porque, no pensamento (e somente no pensamento), trabalhamos em um sentido de fazer abstrações, análises.
        Aristóteles, ao fazer essa virada na filosofia de Platão, redefiniu o papel do filósofo. Este passou a ser aquele que trabalharia com classificações, identificando nas coisas a essência, ou seja, as formas, e os acidentes, mas toda essa observação seria dirigida ao mundo sensível; o mundo, que é um só.
        O que Aristóteles disse foi que Platão não solucionou o problema da mutabilidade versus imutabilidade. Um objeto particular, disse Aristóteles, tem forma e matéria. Isso é uma substância, escreveu ele. Agora, cada substância conteria uma essência, grosseiramente, seria a forma. O filósofo seria aquele que pode, por pensamento, ir fazendo essa distinção e ir catalogando as coisas do mundo, dizendo o que nelas é essencial e o que nelas é acidental. O velho e clássico exemplo, que inclusive serviu durante muito tempo como doutrina, é o do homem: o ser humano, disse Aristóteles, deve ser racional, de modo que isto é parte da essência humana, enquanto que ter ou não cabelo é contingencial.
        Assim, contra o dualismo (ontológico) platônico, que ficou não só como uma característica da metafísica platônica, mas quase que como uma característica de toda metafísica ocidental, Aristóteles trouxe o pluralismo.
        O problema do movimento, em Aristóteles, foi equacionado de outro modo, em termos do que ele chamou de potencialidade e realidade. Cada coisa é em potencial outra, como a semente é em potencial uma árvore. Cada coisa muda na sua parte contingente, mas não na sua essência, de modo que cada coisa possui uma teleologia interna, que a faz entrar em movimento passando do que é potência para o que é ato real.
        A interpretação aristotélica do movimento foi, também, uma teoria causal a respeito do que ele chamou de substância. Assim, ele categorizou os tipos de causas; formais, materiais, eficientes e finais. Substância, para Aristóteles, tem forma e matéria, sendo que a forma é a essência, e esta, por sua vez, tem a ver com a causa formal. Por exemplo, se pensamos em contruir uma boneco a partir de uma pedaço de madeira, temos a forma em nossa mente, e tal forma na nossa mente será a causa formal que criará, quando atuarmos com nosso canivete na madeira, o boneco.
        Agora, a causa material tem a ver com o elemento externo, a própria madeira; sem ela como causa não faríamos o boneco. Todavia, se não botarmos uma certa energia em nosso canivete, nada acontecerá. Quando botamos nosso canivete para funcionar estamos mudando a madeira, transformando-a em boneco, e isso é a causa eficiente ¾ eficientemente causamos o boneco. Se o boneco ficar bom, que era de fato nosso propósito, que ele não desagrade nossos olhos, espelhando proporções agradáveis, isto só ocorreu por conta de um objetivo que tínhamos, uma finalidade, ou, em outras palavras, há aí uma causa final. Com os quatro tipos de causas, eis que então, causa-se o efeito: o boneco.
        Como em Platão, há uma teleologia nessa teoria aristotélica: tudo se movimenta buscando a perfeição. Todavia, se Platão tem as formas perfeitas para serem copiadas pelos elementos mundanos, Aristóteles tem em, cada objeto, um impulso que percorre quatro causas, sendo que a última busca a perfeição.
Teoria da Maiêutica

           A Maiêutica foi elaborada por Sócrates no século IV a.C. Através desta linha filosófica ele procura dentro do Homem a verdade. É famosa sua frase “Conhece-te a ti mesmo”, que dá início à jornada interior da Humanidade, na busca do caminho que conduz à prática das virtudes morais. Através de questões simples, inseridas dentro de um contexto determinado, a Maiêutica dá à luz idéias complicadas.
          Sócrates, seu criador, nasceu por volta de 470 ou 469 a.C., na cidade de Atenas. Ao longo de sua vida ocupou alguns cargos públicos, mas seu comportamento sempre foi modelo de integridade e ética. Sua educação se deu principalmente através da meditação, moldada na elevada cultura ateniense deste período. Ele acreditava não ser possível filosofar enquanto as pessoas não alcançassem o autoconhecimento, percebendo assim claramente seus limites e imperfeições. Assim, considerava que deveria agir conforme suas crenças, com justiça, retidão, edificando homens sábios e honestos, ao contrário dos sofistas, que só buscavam tirar vantagens pessoais das situações.
          Sua forma de viver, porém, com liberdade de opinião, considerações críticas, ironia e uma maneira específica de educar, provocaram a ira geral e lhe angariou uma lista de inimigos. Sob a ótica de seus contemporâneos, ele era visto como líder de uma elite intelectual. Acusado de perverter os jovens e de substituir os deuses venerados em sua terra natal por outros desconhecidos, ele negou-se a elaborar uma defesa própria, pois argumentava que seus ensinamentos eram imortais, não algo para ser compreendido e aceito naquele momento, no âmbito da vida material. Assim, preferiu morrer, recusando inclusive a fuga providenciada por seu discípulo Criton, porque não desejava ir contra as leis humanas. Assim, morreu aos 71 anos de idade, vítima da execução à qual fora condenado.
         O filósofo busca o conhecimento através de questões que revelam uma dupla face – a ironia e a maiêutica. Através da ironia, o saber sensível e o dogmático se tornam indistintos. Sócrates dava início a um diálogo com perguntas ao seu ouvinte, que as respondia através de sua própria maneira de pensar, a qual ele parecia aceitar. Posteriormente, porém, ele procurava convencê-lo da esterilidade de suas reflexões, de suas contradições, levando-o a admitir seu equívoco.
         Por intermédio da maiêutica, ele mergulha no conhecimento, ainda superficial na etapa anterior, sem atingir porém um saber absoluto. Ele utilizava este termo justamente porque se referia ao ato da parteira – profissão de sua mãe -, que traz uma vida á luz. Assim ele vê também a verdade como algo que é parido. Seu senso de humor costumava desorientar seus ouvintes, que na conclusão do debate acabavam admitindo seu desconhecimento. Deste diálogo nascia um novo conhecimento, a sabedoria. Um exemplo comum deste método é o conhecido diálogo platônico ‘Mênon’ – nele Sócrates orienta um escravo sem instrução a adquirir tal conhecimento que ele se torna capaz de elaborar diversos teoremas de geometria.
Método Pedagogizador

        O método “pedagogizador” limita-se a instruir, reproduzir conhecimento, aplicar técnicas ao aluno, tratado como objeto a ser conhecido e treinado.
Seu suporte é a consideração de que há dois fatores estanques em todos os processos em que algum tipo de
conhecimento seja requerido: um sujeito de conhecimento de um lado, e uma realidade a ser conhecida de outro. A conseqüência para a educação, bem como em termos de propostas pedagógicas, é a restrição à aplicação de técnicas a um sujeito, o aluno, tratado como objeto a ser conhecido e treinado. Em contraposição, propomos analisar um modelo calcado na intersubjetividade, mais apto a conduzir para a educação, entendida num sentido construção de pessoas emancipadas, criativas, autônomas. Chamamos este modelo de “modelo educacional”. Mas não consideraremos que diálogo, intersubjetividade, modelo comunicativo, etc., bastem. Será ainda preciso mostrar seus pressupostos teóricos, as implicações decorrentes, e principalmente, como ele pode ser aplicado, aliviando as dificuldades pelas quais passa nossa sociedade, sendo o papel da educação central para compreender essas dificuldades e propor mudanças. Este é um processo complexo, e, evidentemente, a própria educação, especialmente a educação formal, escolar, precisa ser revista com urgência.
        A prática da intersubjetividade, produtora de sujeitos capazes de linguagem e de ação, com opinião e vontade formadas de modo a possibilitar liberdade comunicativa, calcada em razões e argumentações justificadas, legítimas, são os pressupostos de qualquer sociedade democrática, essenciais à educação.As práticas educacionais, ao produzirem indivíduos mais livres, autônomos, e não autômatos, capazes de avaliar seus atos à luz dos acontecimentos, à luz das normas sociais legítimas e legitimadas em processos jurídicos, políticos, usando suas próprias cabeças, e tendo propósitos sinceros e abertos à crítica, são fundamentais para as práticas educacionais. E estas representam o solo de germinação da ação comunicativa. A importância extrema da educação decorre de ela servir como anteparo à tecnicização, à colonização do mundo da vida pelo sistema, mas também deve servir para intervir no meio dinheiro e poder, de modo a enfrentá-los pela democracia e pelo direito.

sexta-feira, 4 de maio de 2012

FILOSOFIA MODERNA

A filosofia moderna coloca a razão, sujeito a exigências da fé na idade média, em liberdade e por fim à dependência do ser humano possibilitando seu esclarecimento, colocando o conhecimento ao seu alcance. Representa (na Europa ocidental) uma retomada do pensamento da antiguidade e libertação do conhecimento do controle da igreja poderosa dispensadora da graça divina na idade média.

Embora represente um retorno do pensamento racional à supremacia, e, em particular um novo olhar ao pensamento platônico, a filosofia moderna em declarar que o conhecimento é acessível e alcançável a todos e não faz separação entre o mundo sensível das coisas e o mundo intangível das ideias. Na antiguidade Platão e Aristóteles visaram à formação de uma sociedade perfeita e feliz através da ação conjunta em prol do bem comum (ação política) na polis. Os habitantes da pólis foram considerados homens esclarecidos, esse esclarecimento foi reservado apenas os cidadãos gregos, não foram incluídos as mulheres, as classes trabalhadoras e muito menos os escravos. A filosofia moderna e o iluminismo não restringiam o conhecimento a uma elite social, religiosa ou intelectual, o colocaram ao alcance de todos que desejavam sair da minoridade, da dependência do tutelar de outros. A sociedade moderna (perfeita) seria o resultado do esclarecimento de todos.

Finalizei a introdução desse texto perguntando se essa época da jornada humana pode ser considerada de fato, como interpretada posteriormente pelos historiadores, uma viagem das trevas à luz ou deve ser interpretado como curso natural das coisas à luz do crescer do conhecimento humano? Estou da opinião que a interpretação retrospectiva é falível, porque sempre apresenta a coloração da opinião pessoal do interprete e a própria história nos mostra que, mesmo com todo o esclarecimento da idade moderna a sociedade está longe de romper todas as trevas da ignorância e da opressão. Mesmo não considerando a passagem um rompimento radical, é claro que os efeitos na caminhada do ser humano rumo ao conhecimento pleno foram grandes. Para mim, os pensadores modernos, os radicais iluministas fizeram sua parte da caminhada da humanidade, são responsáveis em grande parte pelo despertar política na Europa, o desenvolvimento científico e principalmente por disponibilizar a população em geral, conhecimento ora restrito aos eruditos.
O que é o racionalismo?

·  Única fonte de origem do conhecimento é a razão
·  Universal – todos são detentores da razão do bom senso; necessário – sempre assim.
·  Modelo de interpretação racionalista do conhecimento - conhecimento matemático; conhecimento predominantemente conceptual e dedutivo;
·  Tendem para um dogmatismo metafísico;
·  Independente de experiência, seguindo as suas próprias leis;
àTodos os juízos que formula, distinguem-se, além disso, pelas características da necessidade lógica e da validade universal. Pois bem, quando se interpreta e alcança todo o conhecimento humano em relação a esta forma de conhecimento, chega-se ao racionalismo.

Entre os defensores do racionalismo destaca-se Platão e Descartes.

Empirismo

è  Fonte ou origem de conhecimento é a experiência sensível
è  Não há ideias inatas ou património a priori.
è  A concepção de mente: tábua rasa.
è  Os empiristas procedem das Ciências naturais (observação, usando a experiência como fonte e base de todo o conhecimento humano)
è  Tendem para o cepticismo metafísico
è  Deriva de factos concretos, recorrendo á evolução do pensamento e do conhecimento humanos. Primeiro, a criança, começa por ter percepções concretas, depois com base nelas vai formar representações gerais e conceitos. Estas iram nascer organicamente da experiência.


                       
                                         Impressões – são mais vivas e intensas
Tipos de percepções:
                                   Ideias – são menos vivas e menos intensas
                                             – são cópias das impressões



Criticismo Kantiano
(articulação entre sentidos e razão)

à Existem duas faculdades de conhecimento:
§    Sensibilidade (recebe representações; objecto é-nos dado)

                                               Espaço:        forma
                             puras:         tempo
  Intuições:
                             Empíricas:                      matéria


Caracteriza-se:
     - receptividade;
     - passividade (capacidade que tem de receber representações na medida em que é afectado de alguma maneira)
Pensamento Educacional de Platão e Aristóteles
 
           Platão acreditava serem os homens diferentes por natureza, devendo ser colocados em classes que correspondam às diferenças básicas, desenvolveu um plano educacional que atenderia a essa necessidade. Segundo esse plano, os homens seriam selecionados e preparados para trabalhar em uma das três classes por ele enunciadas. Platão procurava empregar a educação para a escolha de homens para os vários deveres de um grupo social. Em cada caso, porém, procurava selecioná-los em termos de sua capacidade, segundo era descoberta pelo próprio sistema educacional. É evidente que Platão considerava a educação uma questão de interesse estatal. Devia ser sustentada e controlada pelo Estado, sendo sua função selecionar e preparar homens para nele servirem. Platão acreditava que, se o Estado adotasse tal sistema educacional, teria uma sociedade ideal, na qual todos se dedicariam ao trabalho para o qual fossem aptos e estivessem preparados, e a sociedade, assim, seria feliz. Aristóteles afirmava que o objetivo da educação é fazer as pessoas virtuosas. O Estado, afirmava ele, deve empregar a educação para criar cidadãos que possam defendê-lo e torná-lo melhor. As teorias de Platão e Aristóteles, ressaltando o emprego da educação pelo Estado como meio de preparar bons cidadãos, não exerceram, em sua época, grande influência na vida de Atenas. Ao contrário, dominava a dos sofistas, na qual a educação se destinava a atender aos interesses individuais. O individualismo daquele tempo não seria logo eliminado por uns poucos filósofos. O povo ouvia-os, mas seguia seus próprios interesses e exigia um tipo de educação que os tornasse mais felizes e lhes proporcionasse maiores êxitos. Viviam empolgados por visões de vitórias pessoais e pela felicidade de certas criaturas; de modo algum sentiam disposição para ouvir os filósofos que davam a entender que o êxito e a felicidade dependiam do bem-estar do grupo. Platão e Aristóteles influenciaram a educação por meio da ética e do conhecimento da vida e da sociedade onde vivem o aprendiz no seu cotidiano. 
ONTOLOGIA

O termo ontologia foi introduzido pelos autores escolásticos no séc. XVII. Rudolf Goclenius, que mencionou a palavra em 1636, poderá ter sido o primeiro a fazê-lo, mas o termo era de tal modo natural em latim e começou a surgir tão regularmente que as disputas sobre quem detém a prioridade da sua introdução são vãs. Alguns autores, como Abraham Calovius, usavam o termo sem o distinguir de metafísica; outros, usavam-no como nome de uma subdivisão da metafísica. Johannes Clauberg (1622-1665), um cartesiano, introduziu em seu lugar o termo ontosofia. No tempo de Jean-Baptiste Duhamel (1624-1706), a ontologia distinguia-se claramente da teologia natural. As outras subdivisões da metafísica são a cosmologia e a psicologia, das quais a ontologia também se distingue. Assim, o termo ontologia, enquanto termo técnico, já existia quando foi finalmente canonizado por Christian Wolff (1679-1754) e Alexander Gottlieb Baumgarten (1714-1762).

Wolff
Para os autores mencionados, a ontologia trata do ser enquanto ser. O termo “ser” era entendido univocamente, como se tivesse um só sentido. A ontologia pode consequentemente reivindicar ter como precursores João Duns Escoto e Guilherme de Ockham, e não Tomás de Aquino. No caso do próprio Wolff, Gottfried Wilhelm Leibniz foi mais influente do que a escolástica, mas na sua Philosophia Prima Sive Ontologia, Wolff refere explicitamente Francisco Suárez. Segundo Wolff, o método da ontologia é dedutivo. O princípio principal que se aplica a tudo o que é é o da não contradição, que sustenta que uma propriedade do próprio ser é que não pode conjuntamente ter e não ter uma dada característica ao mesmo tempo. Daqui, pensava Wolff, seguia-se o princípio da razão suficiente, nomeadamente, que em todos os casos tem de haver alguma razão suficiente para explicar por que qualquer ser existe em vez de não existir. O universo é uma colecção de seres, cada um dos quais tem uma essência que o intelecto é capaz de apreender como ideia clara e distinta. O princípio da razão suficiente é invocado para explicar por que a algumas essências foi concedida a existência e a outras não. As verdades sobre os seres são todas necessárias. Assim, a ontologia nada tem a ver com a ordem contingente do mundo.

A influência da escolástica tardia (ou o que Étienne Gilson chama “essencialismo”) na metafísica racionalista foi paga na mesma moeda, pois a divisão da metafísica em ontologia, cosmologia e psicologia reentrou nos manuais escolásticos, onde persistiu até muito recentemente. Juntamente com esta divisão, persistiu a perspectiva de que o ser constitui um tópico independente para lá dos tópicos das ciências especiais. A persistência desta perspectiva explica-se talvez por factores culturais e não intelectuais. Nos séculos XVIII e XIX a escolástica encontrava-se apenas em seminários, até o Papa Leão XIII ter reintroduzido o tomismo no debate intelectual. Só deste modo a escolástica conseguiu evitar a némesis (na forma de Immanuel Kant) que esperava a metafísica racionalista.

Kant
No anúncio escrito das lições dadas de 1765 a 1766, Kant tratava a ontologia como uma subdivisão da metafísica, incluindo esta a psicologia racional, mas distinguindo-se, neste caso, da psicologia empírica, da cosmologia e do que Kant chamava a “ciência de Deus e do mundo”: “Então, em ontologia, discuto as propriedades mais gerais das coisas, a diferença entre os seres espirituais e materiais.” Mas quando Kant escreveu a Crítica da Razão Pura, resolveu de uma vez por todas as coisas relativamente à ontologia. As duas passagens nucleares são a discussão da segunda antinomia da razão pura e a refutação do argumento ontológico. Wolff argumentara a priori que o mundo é composto de substâncias simples, que não são percepcionadas nem possuem extensão nem configuração, sendo cada uma delas diferente, sendo os objectos físicos compósitos, colecções de substâncias. Na segunda antinomia, a tese é que “toda a substância compósita no mundo consiste em partes simples, e nada existe em parte alguma que não seja ou simples ou composta de partes simples”; e a prova que Kant apresenta é efectivamente wolffiana. Mas Kant apresenta uma prova igualmente poderosa a favor da antítese, nomeadamente, que “nenhuma coisa composta do mundo consiste de partes simples, e nada existe seja onde for que seja simples.” Ao expor a falácia comum às duas provas, Kant tornou possível aceitar uma vez mais a ontologia como um corpo dedutivo de verdades necessárias aparentado à geometria, na sua configuração, mas tendo o ser como objecto de estudo. A sua análise da existência na sua refutação do Argumento Ontológico é uma contraparte a isto.

A partir de Kant, o uso mais influente do termo ontologia, para lá dos manuais de escolástica, tem sido nos escritos de Martin Heidegger e W. V. Quine. Ambos foram saudados pelos autores escolásticos por se entregarem essencialmente à mesma tarefa que eles, adoptando o Padre D. A. Drennen esta perspectiva de Heidegger, fazendo o Padre Bochenski o mesmo no que respeita a Quine.

Heidegger
Com respeito à ontologia de Heidegger, o Padre Drennen tem talvez parcialmente razão. Heidegger queria explicar que carácter tem o ser de ter para que a consciência humana seja o que é. Começa por ter uma rixa com o princípio da razão suficiente na forma que assumiu em Leibniz e Wolff. Isto, afirma, é um ponto de partida inadequado para a ontologia porque a pergunta “Por que há algo em vez de nada?” pressupõe que já sabemos o que são o ser e o nada. Heidegger tratava o “Ser” e o “Nada” como nomes de poderes contrastantes e opostos cuja existência está pressuposta em todos os nossos juízos. Nos juízos negativos, por exemplo, falar do que não se verifica é referir implicitamente o Nada. A ontologia de Heidegger, contudo, não tinha configuração dedutiva nem sequer sistemática. Procede por vezes por meio da exegese da poesia ou dos fragmentos mais aforísticos dos filósofos pré-socráticos, sendo assim muito diferente da ontologia escolástica.

Quine
No caso de Quine, o nome ontologia tem de facto sido dado a um conjunto bastante diferente de preocupações. Quine preocupou-se com duas perguntas intimamente relacionadas: A crença numa dada teoria compromete-nos com a existência de que tipo de coisa? E quais são as relações entre a lógica intensional e extensional? A sua resposta à primeira pergunta é que ser é ser o valor de uma variável: temos de admitir a existência daquela gama de entidades possíveis cujos nomes podem ocorrer como valores daquelas variáveis sem as quais não podemos formular as nossas crenças. A sua resposta à segunda pergunta é que as lógicas intensionais e extensionais envolvem a admissão não apenas de tipos diferentes de entidade, mas também de tipos incompatíveis de entidade. “Os dois tipos de entidade só podem ser acomodados na mesma lógica com o género de restrições de Church, que servem para não os misturar, e isto é quase uma questão de ter duas lógicas separadas com um universo para cada” (From a Logical Point of View, p. 157).

É claro que as preocupações de Quine são de facto relevantes para Wolff e para os escolásticos apenas no sentido em que uma compreensão das investigações de Quine nos impediriam de tentar construir uma ontologia dedutiva à maneira de Suárez ou Wolff.


Problemas da ontologia
A ontologia é a ciência ou estudo mais geral do Ser, Existência ou Realidade. Um uso informal do termo significa o que, em termos gerais, um filósofo considera que o mundo contém. Assim, diz-se que Descartes propôs uma ontologia dualista, ou que não há deuses na ontologia de d’Holdbach. Mas no seu significado mais formal, a ontologia é o aspecto da metafísica que visa caracterizar a Realidade identificando todas as suas categorias essenciais e estabelecendo as relações que mantém entre si.

Ser enquanto ser
A existência, a mais compreensiva categoria de todas, deve abranger membros que têm o mínimo em comum. Contudo, a filosofia ocidental procura há muito um conteúdo substancial comum que esteja presente em seja o que for unicamente em virtude de existir. A história destas tentativas para identificar o carácter comum do ser enquanto ser não é encorajante.

No Sofista, o Estrangeiro Eleata de Platão propõe que um papel na rede causal do mundo é uma condição necessária e suficiente da existência, que “o Poder é a marca do Ser.” Esta ideia tem tido alguma circulação no séc. XX, particularmente no trabalho de David Lewis (1986) e D. M. Armstrong (1978, 1989, 1997). Este princípio eleático é um teste atraente da realidade no mundo natural, pois seja o que for que for real na natureza deve ser capaz de fazer qualquer diferença. Pode ser necessário enfraquecer a exigência, admitindo um espaço-tempo passivo que forneça a arena na qual actuam os seres activos. Mesmo assim, o princípio eleático parece que é na melhor das hipóteses um aspecto contingente do mundo porque não parece haver qualquer impossibilidade envolvida na ideia de um ser completamente inerte. E é também uma petição de princípio contra entidades abstractas como os números, ou pontos geométricos, ou conjuntos, que, se existirem, estão fora do nexo causal.

Para Samuel Alexander (1920), ser é ser o ocupante exclusivo de um volume de espaço-tempo. Isto elimina não apenas entidades abstractas, mas até uma teoria dos campos do mundo natural, pois os campos de forças ocupam regiões do espaço-tempo mas não se excluem entre si.

J. M. E. McTaggart (1921-1927) argumentou que a marca do ser é estar numa correspondência de determinação com todas as suas partes infinitas. Uma correspondência de determinação assegura que de uma descrição suficiente de algo se pode derivar uma descrição suficiente de qualquer das suas partes. Esta exigência acarreta que o espaço, o mundo natural, e a maior parte dos conteúdos das mentes, são irreais. Desta consequência a conclusão a retirar é que a marca do ser proposta por McTaggart é excessivamente exigente.

O problema de um conteúdo substancial para o ser enquanto ser reflecte-se no comportamento idiossincrático do verbo “existir.” Considere-se negativas singulares: “Aristóteles não fala espanhol” é verdadeira porque o predicado “não fala espanhol” se aplica ao item referido pelo termo sujeito. Mas “Pégaso não existe” não pode ser verdadeiro em virtude de o predicado se aplicar ao item referido pelo termo sujeito. Se o termo sujeito refere seja o que for, esse item existe, o que tornaria toda a frase falsa.

Ficou famosa a declaração de Kant de que a existência não é uma propriedade, e esta perspectiva tornou-se amplamente aceite. A lógica moderna que descende de Gottlob Frege e de Principia Mathematica (1910-1913) de Alfred North Whitehead e Bertrand Russell substitui todas as expressões “existe” por “há.” Assim, “Os leões existem” torna-se “Há leões,” ao passo que “Os dragões não existem” se torna “Não há dragões.”

Em termos técnicos, este processo substitui qualquer afirmação de existência por uma afirmação que usa um quantificador que abrange um domínio (o mundo), de modo que existir se torna uma questão não de possuir uma propriedade especial, a existência, mas de possuir alguma outra propriedade corriqueira. A determinação de reformular todas as afirmações de existência ou inexistência com “Há…” e “Não há…” é expressa pelo dictum de W. V. Quine: “Ser é ser o valor de uma variável.”

Se a existência não é uma propriedade, não pode ser uma perfeição. Isto anula aquelas versões do argumento ontológico a favor da existência de Deus que dependem de a existência ser uma das perfeições. Uma resposta recente consistiu em argumentar que, mesmo não sendo a existência uma propriedade, a existência necessária é-o (Plantinga, 1974, 1975; van Inwagen 1993).

Realidade e efectividade
É a existência tudo o que há, ou devemos reconhecer categorias ainda mais vastas do que a do Ser? Em Platão, e mesmo antes, encontra-se uma distinção entre Realidade (O que é) e a Aparência (O que não é nada, e no entanto apenas parece Ser). Aristóteles distingue o existente completo (Ser), do que está ainda em formação (Tornar-se). Estas distinções vêem-se talvez melhor como uma maneira de advogar que há diferentes graus de realidade no seio da categoria do Ser.

Aristóteles distinguia também o completamente Real (Acto) do que pode ser (Potência). Esta distinção antecipa uma corrente forte em ontologia que reconhece mundos possíveis para lá do mundo efectivo, aquele que habitamos. Nos neoplatónicos, e mais tarde em Alexius Meinong, ao domínio do existente soma-se o do subsistente, que abrange o que não existe apesar de poder ter existido, como acontece com as montanhas douradas.

Uma ontologia completa deste género, na qual o domínio da Essência é mais lato do que o da Existência, foi apresentada por James K. Feibleman em 1951. No trabalho de Richard Sylvan (1980), isto alarga-se ainda mais. No seu sistema, as variáveis individuais abrangem não apenas o efectivo e o possível, mas também o impossível.

Mundos possíveis. Gottfried Wilhelm Leibniz foi o primeiro a fazer um uso sistemático da ideia de que se pode considerar que todas as possibilidades formam mundos — cada um dos quais é um domínio internamente consistente que pode combinar alguns elementos iguais aos do mundo efectivo e outros diferentes. O mundo efectivo é um dos mundos possíveis, distinguindo-se de todos os outros pelo facto de que nenhum dos seus elementos é meramente possível. Se podermos referir-nos a mundos possíveis, é fácil definir seres necessários, que de outro modo são tão difíceis de caracterizar, como aqueles seres que estão em todos os mundos possíveis (ver mais à frente).

Realismo modal. Os mundos possíveis põem à nossa disposição explicações de poderes causais, de condicionais contrafactuais, de disposições inexercidas e de propriedades reais ininstanciadas. Estas vantagens levaram David Lewis (1986) a abraçar o realismo modal, que afirma a realidade literal de todos os mundos possíveis.

Outros filósofos, apesar de valorizarem estas vantagens, recuam perante a expansão aparentemente infinita da ontologia que isto exige, o que conduziu a explicações em termos de sucedâneos de mundos possíveis: Rudolf Carnap, entre outros, propôs que um mundo possível é um conjunto maximamente consistente de frases. Armstrong, entre outros, desenvolveu a ideia de Wittgenstein de que um mundo possível é uma recombinação inefectiva dos elementos deste mundo. Peter Lopston (2001) defende um realismo redutivo, que expande o tipo de propriedade atribuída no mundo efectivo de modo a incluir características que poderia-ter-tido. O sucesso destas abordagens é tema actual de controvérsia.

Pluralidade de mundos na teoria quântica. A noção de que o mundo em que vivemos não é o único foi também recentemente esboçada na interpretação de alguns paradoxos da física quântica, que de outro modo são desconcertantes. Nestas explicações, o mundo não é uma entidade única e unificada, mas antes algo sujeito a bifurcações contínuas, um processo que gera um número cada vez maior de mundos. As perspectivas deste género que defendem a pluralidade de mundos são diferentes, numa acepção importante, do realismo modal: todos estes mundos quânticos são supostamente efectivos, mas mutuamente inacessíveis.

As categorias do ser
A principal tarefa da ontologia é fornecer um inventário das categorias, as divisões mais gerais da Realidade. As mais importantes são as seguintes:

Substâncias. Uma substância individual ou particular é um objecto, uma coisa por direito próprio. As coisas comuns do quotidiano, como tijolos e camas, fornecem um modelo para a categoria da substância. Exige-se que as substâncias tenham várias características básicas, apesar de não ser claro que estas características sejam compatíveis entre si.

Particularidade e individualidade. Uma substância é simultaneamente um particular e um indivíduo; não é apenas um pato qualquer, mas precisamente este pato. Um objecto é da categoria que é (um pato) em virtude das suas propriedades. Mas se estas propriedades são universais, partilhadas por muitos particulares, não podem por si conferir particularidade. Alguns filósofos, o mais influente dos quais foi Locke, propuseram um constituinte das substâncias que desempenhariam este papel, um substrato que conferiria particularidade e individualidade. Um substrato seria um particular bruto, um item inerentemente particular e individual, mas sem qualquer outra característica. É difícil ver como esses particulares brutos poderiam distinguir-se entre si, mas se os particulares brutos são todos exactamente parecidos entre si, como poderia qualquer um deles individualizar a sua própria substância? Mais em geral, os particulares brutos entram em conflito com o dictum de Aristóteles de que o mínimo de ser, a menor coisa que pode ser, é um “isto-tal”, um particular que tem uma propriedade.

Outra proposta é que se individua as substâncias pela sua localização. As localizações — pontos de espaço-tempo e regiões — são em si particulares únicos; se puderem ter particularidade primitiva, isso levanta a questão de saber por que razão os outros particulares requerem um substrato ou outro particularizador. Há também outras dificuldades com a localização: a localização não individua campos de forças ou outras entidades físicas que não monopolizam o seu espaço. Não funciona também para quaisquer itens de tipo imaterial.

Ou a individualidade — e portanto a particularidade — é primitiva, ou há particulares brutos, ou cada substância tem uma propriedade especial, chamada ecceidade ou istidade, que pode conceder particularidade e individualidade ao seu portador. Para uma discussão deste problema veja-se o capítulo quinze de From an Ontological Point of View, de John Heil (2003).

Indivisibilidade. As substâncias têm de ser distintas dos compostos, de modo que uma substância única tem de ser indivisível, no sentido de não ter partes que sejam elas mesmas substâncias. Isto elimina as coisas comuns, que não podem ser substâncias. Esta exigência de simplicidade é muito enfatizada na doutrina de Tomás de Aquino sobre Deus. Leva em Leibniz à monadologia e em Roger Joseph Boscovich à doutrina dos pontos materiais.

Persistência. As substâncias distinguem-se das suas propriedades porque têm a capacidade de persistir, isto é, retêm a sua identidade passando por pelo menos algumas mudanças. Um carro dos bombeiros pode mudar de cor, e no entanto continuar a ser o carro dos bombeiros que sempre foi. As substâncias compostas comuns da vida quotidiana têm alguma persistência, mas não podem sobreviver a todas as mudanças. Um carro dos bombeiros desmontado e reduzido a sucata já não é um carro dos bombeiros. A persistência completa pertence apenas às substâncias fundamentais.

Independência. Qualquer substância poderia ser a única coisa em existência. Se esta independência for interpretada causalmente, nenhum objecto comum é uma substância, pois todos são postos em existência, e por isso a sua existência depende das suas causas. O espaço-tempo e os seus campos poderiam considerar-se substâncias, mas mesmo estes dependem, nos sistemas teístas, da actividade criadora de Deus. Assim, no tomismo, Deus é a substância por excelência, mas o mundo natural inclui substâncias criadas, que dependem de Deus mas que, noutros aspectos, existem por si. Espinosa, insistindo na independência absoluta, concluiu que só pode haver uma substância, a totalidade omniabrangente, Deus-ou-Natureza.

Se tomarmos a independência das substâncias num sentido lógico e não causal, uma substância é seja o que for que, em princípio, pode subsistir sozinha. Esta era a exigência de David Hume, e seja o que for que lhe obedecer é uma substância humiana. Para compostos, a exigência é que a coisa, incluindo todas as suas partes, poderia existir sozinha. Esta exigência é muito menos rigorosa do que a independência causal e não exige persistência.

Teorias da ausência de substância. Tem-se tentado eliminar as substâncias. Russell propôs que um objecto concreto comum não é mais do que um feixe de todas as suas propriedades. Mas há sempre a questão de saber o que agrega o feixe. Além disso, dado que as propriedades são universais, esta teoria acarreta que nenhumas duas coisas podem ter uma parecença exacta.

Na versão de Donald Williams da teoria dos feixes (1966), as propriedades são instâncias particulares ou tropos (ver mais à frente). Isto evita o problema da possibilidade de haver dois objectos com uma parecença exacta, mas exige que todos os membros do feixe estejam “co-presentes” — exige que estejam todos no mesmo lugar do espaço-tempo. Há dificuldades em tratar uma localização no espaço-tempo como se fosse apenas mais um tropo no feixe, mas se lhe for dado um tratamento especial torna-se um substrato substancializante.

Russell defendeu também uma ontologia de eventos como uma perspectiva de ausência de substância. Russell usava “evento” para a ocorrência de uma propriedade num dado lugar e num dado momento do tempo; tais eventos não são aconteceres, mas antes estados de coisas (veja-se mais à frente). Propôs que as substâncias comuns, e as suas partes mais fundamentais, são sequências de agregados de tais eventos.

Os elementos básicos nestas ontologias podem não ser simples nem indivisíveis, e não têm persistência. Contudo, estes estados de coisas ou eventos são substâncias humianas. Na verdade, a menos que não exista coisa alguma, algo tem de ser uma substância humiana e, nesse sentido, qualquer teoria da ausência de substância tem de estar errada.

Propriedades e relações. As propriedades são as características intrínsecas das coisas, que lhes pertencem quando as consideramos individualmente. As relações, envolvendo dois ou mais termos, são os modos sob os quais as coisas estão perante outras. Em muitos aspectos, as propriedades e as relações podem ser tratadas conjuntamente.

Propriedades como universais. As propriedades são habitualmente concebidas como universais que podem caracterizar um número infinito de instâncias. Só há uma Torre Eiffel, mas a altura da torre, o peso e a constituição de ferro são características que tem em comum com muitas outras coisas. O Problema dos Universais é o problema de explicar como poderia uma qualquer entidade real existir, total e completamente, em muitas instâncias diferentes. Este problema atraiu três propostas de solução: nominalismo, conceptualismo e realismo. O nominalismo e o conceptualismo negam, ambos, que as propriedades sejam genuinamente universais. Segundo o nominalismo, o único elemento comum a todas as coisas de ferro é poderem todas ser descritas usando o predicado “de ferro,” ou serem todas membros da classe das coisas de ferro, ou serem todas parecidas a alguns objectos de ferro típicos. Segundo o conceptualismo, o elemento universal consiste num impulso das nossas mentes para agrupar várias coisas. Estas teorias reducionistas têm tido partidários desde o tempo de Platão e foram especialmente prevalecentes entre os empiristas britânicos e os seus descendentes. O nominalismo e o conceptualismo foram explicitamente postos em causa por Russell nos Problemas da Filosofia (1912). A argumentação mais exaustiva contra tais perspectivas foi apresentada por D. M. Armstrong, Universals and Scientific Realism (1978).

O realismo com respeito aos universais é pelo menos tão velho quanto Platão. A sua teoria das Formas apresenta um realismo consumado que atribui às propriedades genuínas quer existência real, num domínio próprio, quer um estatuto superior a quaisquer instanciações que delas possam existir neste mundo. As Formas existem ante rem — isto é, estejam ou não instanciadas. Considera-se tradicionalmente que Aristóteles sustenta um realismo modificado, segundo o qual as propriedades são reais, e universais, mas só podem existir in rebus, enquanto propriedades de instâncias concretas. Encontra-se aqui uma vez mais a sua perspectiva de que o mínimo “susceptível de ser” é um isto-tal, uma união de um particular com um universal.

O realismo encontrou sempre duas objecções principais. Primeiro, que não é económico, especialmente na sua forma platonista. A questão da economia é um tema actual na filosofia da ciência, dado que pelo menos aparentemente as nossas melhores teorias físicas e químicas envolvem propriedades não instanciadas. A segunda objecção é que não consegue fornecer uma explicação coerente da ligação entre uma propriedade e a substância que é sua portadora, sendo esta a relação de inerência. A inerência não pode ser uma relação normal, porque nesse caso é apenas mais um universal que precisa de uma ligação de inerência entre os seus termos, a substância e a propriedade original. Mas se isto não é uma relação no sentido comum, é o quê? O problema da inerência dá sustentação a versões do realismo nas quais as propriedades são particulares.

Propriedades como particulares. Mesmo que a propriedade de ferro seja universal, o caso particular de ser de ferro que ocorre na Torre Eiffel pertence apenas à torre e é tão particular quanto a própria torre. A teoria dos tropos, tal como foi pela primeira vez desenvolvida por Donald Williams, trata a instância não como uma entidade dependente que emerge da instanciação de um universal, mas como uma substância humiana de pleno direito.

Quando se combina esta abordagem com uma explicação das substâncias comuns com muitas características em termos de feixes ou co-presença, o problema da relação de inerência desaparece. Há também outra economia significativa, pois não é preciso ter uma categoria separada para substâncias. Estas possibilidades são exploradas no livro Abstract Particulars, de Keith Campbell (1990).

Relações. Quando Russell reanimou o debate sobre o realismo deu às relações um estatuto inteiramente igual ao das propriedades inerentes. Na verdade, foram as suas reflexões sobre o papel das relações nos fundamentos da matemática e da lógica que o conduziram ao realismo. O realismo de Armstrong assume a mesma forma.

Há, contudo, uma longa tradição que atribui primazia às propriedades intrínsecas. Aristóteles sustentava que as relações são “a menor das coisas que são”; Hobbes, entre outros, sustentava que a existência de relações depende de um acto mental de comparação; e a perspectiva de Leibniz era que toda a relação se fundamenta numa característica intrínseca de um dos seus termos, ou de ambos. Este programa reducionista é exposto em Campbell (1990).

As relações são aparentemente dependentes, no sentido em que têm de ter substâncias como termos, e estas substâncias têm de ter propriedades intrínsecas. Assim, a menos que existam propriedades intrínsecas não poderá haver relações, mas não vice-versa. As teorias dos feixes, aplicadas a coisas comuns, dizem respeito apenas às propriedades intrínsecas. Incluir relações nos feixes conduz a problemas quanto ao lugar a dar às relações, o que por sua vez induz uma tendência a favor de um monismo como o de Francis Herbert Bradley, no qual as substâncias comuns são absorvidas numa totalidade única omniabrangente.

Poderes. Algumas propriedades, como quadrado, parecem pertencer ao modo de ser do objecto. Outras, como ser um solvente, parecem referir ao que um objecto pode fazer. Esta é a distinção entre propriedades categoriais e disposicionais. Uma linha de investigação retoma o princípio eleático e identifica as propriedades reais com as que conferem ao seu portador uma disposição para agir ou para ser objecto de actuação. Tais disposições são poderes; uma metafísica dos poderes é avançada no livro Powers, de George Molnar (2003) e em Scientific Essentialism, de Brian Ellis (2001).

Complexos. Substância e propriedade são categorias básicas. Em combinação, podem fornecer uma ontologia mais rica.

Estados de coisas. Um estado de coisas básico consiste num particular que tem uma propriedade, ou em duas (ou mais) particulares que estão numa dada relação. Uma propriedade única que inere num só particular é um mínimo “isto-tal.” O Tractatus Logico-Philosophicus (1921) de Wittgenstein apresentou uma ontologia na qual o mundo é composto de estados de coisas relacionais mínimos: os que efectivamente ocorrem são factos, restando além destes os meramente possíveis. Estes temas — que as categorias básicas só ocorrem em combinação, e que estas combinações constituem a realidade — são retomadas por D. M. Armstrong, no livro A World of States of Affairs (1997).

Eventos e processos.Um estado de coisas é estático. Dar conta dos aspectos dinâmicos do mundo exige uma explicação da mudança. Isto pode fazer-se usando sequências de estados de coisas: a estabilidade consiste em estados de coisas sucessivos muitíssimo parecidos entre si, ao passo que a mudança consiste em estados de coisas que a dada altura são substituídos por outros sistematicamente diferentes. Um evento é uma mudança singular, envolvendo um par de estados de coisas; um processo é uma série mais complexa de eventos.

Whitehead, em Process and Reality (1929), deu prioridade ao dinamismo; todas as substâncias que persistem aparentemente são efectivamente processos que se dão muito lentamente. O estatuto do espaço-tempo é controverso. Pode ser uma substância humiana; contudo, algumas explicações da matéria atribuem-lhe um lugar enquanto processo, uma sequência de relações mutáveis complexas entre particulares.

Objectos abstractos
O pensamento humano, especialmente na matemática e na lógica, parece envolver entidades que não têm aparentemente lugar no mundo espácio-temporal. Admitir tais itens é um desafio ao princípio da economia; contudo, é difícil conseguir reduções bem-sucedidas.

Números e conjuntos. Porque se pode representar todos os números na teoria de conjuntos, não é preciso admitir conjunto e números. Russell propôs-se eliminar os conjuntos a favor de funções proposicionais, mas isto revelou-se impossível de aplicar a mais do que um fragmento da matemática (Goodman e Quine 1947, Quine 1969). Porque as variáveis da teoria de conjuntos têm conjuntos como valores, e porque ser é ser o valor de uma variável, estamos comprometidos com a sua realidade — e isto é platonismo quanto a conjuntos e números. O tentativa mais importante de evitar o platonismo é o de Hartry Field (1980, 1989).

Objectos geométricos. Diferentemente de seja o que for que ocorra no mundo natural, os objectos da geometria — cubos euclidianos, por exemplo — são concebidos como perfeitos, imutáveis, intemporais e sem poderes físicos causais. Além disso, há geometrias, e objectos geométricos correspondentes, com muitas mais dimensões do que as que este mundo tem. Um espaço geométrico pode dividir-se e subdividir-se numa infinidade de configurações de diferentes dimensões. O platonismo na geometria envolve assim uma expansão infinita na ontologia.

Uma abordagem a esta questão é considerar que os objectos geométricos são abstraídos, isto é, tirados do seu contexto. Deste ponto de vista, todo o cubo é apenas um fragmento espacial particular de espaço-tempo e todo o triângulo é um fragmento de uma das superfícies espaciais do espaço-tempo. Um problema desta abordagem é que nem todas as formas estarão disponíveis. Se o nosso espaço-tempo está longe de ser perfeitamente euclidiano, não haverá cubos reais euclidianos. Podemos tratar estes objectos inexistentes como variações imaginárias das que efectivamente existem, e considerar que as geometrias que quantificam sobre tais coisas não são literalmente verdadeiras.

Lógica. A filosofia da lógica faz referência a proposições, operadores, funções e inferências. Estas são entidades abstractas, que se relacionam com o raciocínio aproximadamente do mesmo modo que os números se relacionam com a contagem e a medição. Os problemas e possibilidades de sucesso de um tratamento reducionista destas entidades são igualmente paralelos.

Seres necessários
Considera-se habitualmente que as coisas comuns existem contingentemente; isto é, existem, mas poderiam não existir. Tivessem as leis da natureza do nosso mundo sido diferentes, ou as condições iniciais, e haveria um grupo diferente de seres contingentes. Mas algumas coisas parecem imunes aos caprichos causais e do acaso; situando-se fora da rede causal, não podem ser trazidos à existência e não podem ser destruídos. São “seres necessários.” Se o platonismo estiver correcto com respeito a quaisquer objectos abstractos, haverá seres necessários e até, paradoxalmente, a classe vazia.

Para Aristóteles, seja o que for que exista ao longo de um tempo infinito é necessário porque ele defendia que ao longo de um tempo infinito todas as possibilidades acabariam por se efectivar. Para Plotino, qualquer ser divino estaria fora do tempo, e como tal não poderia mudar, não poderia deixar de existir e consequentemente seria um ser necessário. Para Tomás de Aquino, a necessidade de Deus deriva da sua simplicidade: a essência de Deus e a sua existência são idênticas; deste modo, Deus é um tipo de ser que tem de existir. Para Espinosa, toda a substância genuína é causa sui, contendo em si a explicação suficiente do seu próprio ser, e portanto pode garantir a sua própria existência sob todas as condições possíveis.

Duns Escoto, e depois Descartes, ligou o ser necessário à lógica: um ser necessário é aquele cuja inexistência seria auto-contraditória. “Os feijões reais não existem” é auto-contraditória mas apenas trivialmente porque a existência foi inserida na definição do sujeito. Isto não faz dos feijões feijões necessários. Se a existência não for inserida na definição do termo sujeito, é duvidoso que qualquer negação de existência seja auto-contraditória. A melhor discussão da noção de ser necessário é a de Alvin Plantinga (1974, 1975).


Fontes primárias:

•Baumgarten, Alexander Gottlieb. Metaphysica. Halle, 1740.
•Clauberg, Johannes. Opera Omnia, edited by J. T. Schalbruch. 2 vols., 281. Amsterdam, 1691.
•Duhamel, Jean-Baptiste. De Consensu Veteris et Novae Philosophiae. Paris, 1663.
•Duns Scotus, John. Opera Omnia. 12 vols. Paris, 1891-1895. Vol. III, Quaestiones Subtillissimae Super Libros Metaphysicorum Aristotelis.
•Heidegger, Martin. Being and Time. Trad. John Macquarrie e Edward Robinson. New York: Harper, 1962.
•Heidegger, Martin. Existence and Being. Trad. D. Scott, R. Hall, e A. Crick. Chicago: Regnery, 1949.
•Kant, Immanuel. Critique of Pure Reason. Trad. Norman Kemp Smith. London: Macmillan, 1929.
•Quine,Willard Van Orman. From a Logical Point of View. Cambridge, MA: Harvard University Press, 1953.
•Wolff, Christian. Philosophia Prima Sive Ontologia. Frankfurt and Leipzig, 1729.
•Wolff, Christian. Philosophia Rationalis, Sive Logica Methodo Scientifica Pertractata et ad Usum Scientiarum Atque Vitae Aptata. Frankfurt and Leipzig, 1728.